Breve História do Cinema Português de Animação
A História do Cinema Português de Animação inicia-se em 1923 com a realização do filme de desenhos animados “O Pesadelo de António Maria”. Este pequeno filme sobre o político António Maria abria um novo quadro da Revista “Tiro ao Alvo” e era considerado na altura “um filme cómico da mais flagrante actualidade”[1].
Seguem-se alguns filmes: “Tip Top” (1925), “Uma história de Camelos” (1930), a“A Lenda de Miragaia” (P:1930;E:1931), "A Balda da Fonte" (1933) e "Semi-Fusas" (1934). Surge depois, já na época do cinema sonoro, “O Boneco Rebelde” em 1941/42 e “Automania” de Servais Tiago em 1943, que ganha o Galo de Ouro e o 1º prémio da casa Pathé.
Após estes pequenos filmes de autor, que encontramos na história do cinema, desde 1923 até 1941, a animação segue por outros caminhos, e é na publicidade que encontra refugio.
Aparecem os vários estúdios de publicidade, como os estúdios Kapa e posteriormente os estúdios Cineca, que se dedicam a trabalhar o anúncio publicitário animado, destinado ao público do cinema[2].
Em 1957 surge em Portugal um novo média – a Televisão – que veio, de certo modo, impulsionar a animação publicitária.
Produzir animação era na altura (e ainda hoje), bastante difícil em Portugal: requer imenso tempo, recursos humanos e material apropriado, o que eleva os orçamentos de produção.
Sem qualquer tipo de apoio estatal à produção independente, a publicidade surge como um meio de conseguir manter viva uma actividade de que tantos gostavam, uma vez que eram remunerados pelo seu trabalho.
Tornou-se então comum, no meio da animação, os realizadores produzirem pequenos filmes animados para produtos, sem que as empresas, que promoviam esses mesmos produtos, o tivessem proposto, um sistema a que se dá o nome de “ghost”. Muitos dos filmes realizados desta forma tinham a sorte de serem aceites pelo cliente. Foi deste modo que se fez animação durante muito tempo em Portugal.
Esses filmes publicitários concorriam também em festivais de animação, nas categorias de publicidade. Muitos realizadores de Animação Portuguesa foram premiados em festivais internacionais. Artur Correia ganhou o Prémio Annecy em 1967 com o filme “O Melhor da Rua”, um filme publicitário para a Schweppes (que apesar de ser vencedor, não foi aceite pela empresa promotora).
Será deste modo que a animação portuguesa sobreviverá até 1970, quando reaparece o filme de autor. “Eu quero a Lua", filme de Artur Correia, e único filme não comercial produzido pela Topefilme, vem abrir um novo caminho. “Eu Quero a Lua” é exibido em Bilbau em 1972 e é premiado com uma medalha de ouro.
Entretanto o panorama do cinema começa a mudar: Assiste-se em 71 à criação do Instituto Português do Cinema[2] que possibilita a realização de uma série de Contos Tradicionais Portugueses também da autoria de Artur correia e de Ricardo Neto. Todos os filmes desta série viriam a ser apoiados pelo IPC. Aliado ao apoio do IPC ao cinema de animação, a RTP faz várias encomendas a estúdios de animação para desenvolvimento de filmes educativos e aparecem depois as séries televisivas, como o “Romance da Raposa”.
Em 1974 Vasco Granja inicia um programa de cinema de animação de autor, que se manteve no ar durante dezasseis anos. No anos seguinte nasce a Associação Portuguesa de Cinema de Animação, também pela mão de Vasco Granja, e em 1977, realiza-se pela primeira vez o Cinanima, Festival Internacional de Cinema de Animação, e um dos marcos mais importantes na história do Cinema Português de Animação.
Contudo, este panorama, aparentemente positivo, não irá durar muito, e a partir dos anos 80 a produção de animação irá decair, mas desta vez, associado à crise nacional, está outro aspecto bastante relevante: a transformação e reestruturação de todo o sistema publicitário. Não nos podemos esquecer de que é na década de 80 que surgem as multinacionais, grandes empresas/grupos de publicidade, que acabam por esmagar produtoras mais pequenas, que, ou são compradas pelas multinacionais, ou se reorganizam em pequenos ateliers. Estas multinacionais acabam por comprar um maior número de espaço comercial nas televisões o que provoca uma procura menor por parte de outras empresas deste espaço, como consequência a produção de filmes publicitários animados diminui! A própria ideia de publicidade modifica-se. Os criativos passam a trabalhar com uma equipa formada: doutorados, psicólogos, assessores de marketing. Isso faz com que muitas vezes o filme de imagem real seja escolhido em detrimento da animação, remetida na maior das vezes para o filme publicitário dirigido ao público infantil[4].
Felizmente, os ateliers criados pelo Cinanima, e o impulso das novas gerações, influenciaram de modo positivo o Cinema de Animação, fazendo ressurgir o filme de autor.
Desde 1991 que o número de curtas-metragens de animação produzidas em Portugal tem vido a crescer significativamente. No ano de 2003 foram registados 14 filmes, e as médias de produção de 2004 a 2006 não se afastam muito deste número.
Mas seria possível fazer ainda mais e melhores filmes se não existisse uma deficiente dimensão do mercado aliada à situação desprotegida da produção portuguesa face aos filmes estrangeiros.
De qualquer modo o Cinema Português de Animação “vai no bom caminho”: os filmes produzidos apresentam uma elevada qualidade técnica e artística, sendo na maioria das vezes premiados em festivais internacionais. “A Suspeita” (1999) de José Miguel Ribeiro, que venceu 27 prémios [5], incluindo o Cartoon d’Or 2000, é um exemplo da qualidade da produção portuguesa. Mais recentemente temos o filme "História Trágica com final Feliz" (2005), de Regina Pessoa, que prima também pela sua qualidade, tendo ganho no passado mês de Junho o Grande Prémio de Annecy.[6]
Foram publicadas ainda as primeiras obras dedicadas ao Cinema de Animação Português. Em 2001 António Gaio publica "História do cinema Português de Animação – Contributos", é lançado também o livro Cinanima 25 anos, e “Cinema sem Actores – Novas Tecnologias da Animação Centenária”, de António Costa Valente. Em 2004, Ilda Castro publica "Animação Portuguesa -conversas com…".
Acontece ainda a criação de ateliers de animação no Festival de Avanca, assim como a criação de cursos que contemplam a animação como unidade curricular. Embora não exista em Portugal nenhum curso do ensino superior com a designação de Cinema de Animação, escolas como a ETIC (Escola Técnica de Imagem e Comunicação) ou a RESTART vão preenchendo o vazio que se faz sentir nesta área. Existem no entanto cursos do ensino superior que apostam já na escolha de uma unidade curricular dedicada à Animação para complementar a formação dos alunos, a UALG (Universidade do Algarve) foi a primeira universidade a integrar disciplinas de Imagem Animada nos seus cursos, actualmente, o curso de Design desta instituição possui duas disciplinas (Imagem Animada) no seu plano curricular; mais recentemente, na UBI (Universidade da Beira Interior) foi criado um mestrado em Estudos Fílmicos, que contempla também uma disciplina, intitulada Cinema de Animação. São pequenos passos que encaminham o Cinema de Animação e nomeadamente o Cinema de Animação Português, que necessita não só de criadores, mas de indivíduos qualificados que lhe dediquem o cuidado e estudo que merece.
[1] In Diário de Noticias ( 23 de Janeiro de 1923)
[2] Até o surgimento da televisão era costume passar no cinema, antes da sessão, um jornal de actualidades, um documentário de actualidades assim como pequenos filmes publicitários.
[3] O Instituto Português do Cinema é criado pelo Descreto Lei 7/71, contudo só em 1973 inicia a sua actividade
[4] É possivel que o filme de animação tivesse como objecto produtos dirigidos ao publico infantil. O Vitinho, associado à marca Milupa, é uma das criações mais evidentes das estratégias de marketing. Se verificarmos as encomendas de trabalhos de animação encontramos anunciados muitos produtos infantis, como chocolates, cromos, pastilhas, gelados etc.
[5] O Filme "A Suspeita" acumulou, entre 1999 e 2001, 27 prémios e 1 menção honrosa, nos 21 festivais onde concorreu. [Informação cedida por Paulo Cambraia]
[6] O filme "História Trágica com Final Feliz" de Regina Pessoa possui uma página: http://www.historiatragicacomfinalfeliz.com/ onde se pode encontrar, entre outras informações, a lista completa de prémios ganhos pelo filme.
Seguem-se alguns filmes: “Tip Top” (1925), “Uma história de Camelos” (1930), a“A Lenda de Miragaia” (P:1930;E:1931), "A Balda da Fonte" (1933) e "Semi-Fusas" (1934). Surge depois, já na época do cinema sonoro, “O Boneco Rebelde” em 1941/42 e “Automania” de Servais Tiago em 1943, que ganha o Galo de Ouro e o 1º prémio da casa Pathé.
Após estes pequenos filmes de autor, que encontramos na história do cinema, desde 1923 até 1941, a animação segue por outros caminhos, e é na publicidade que encontra refugio.
Aparecem os vários estúdios de publicidade, como os estúdios Kapa e posteriormente os estúdios Cineca, que se dedicam a trabalhar o anúncio publicitário animado, destinado ao público do cinema[2].
Em 1957 surge em Portugal um novo média – a Televisão – que veio, de certo modo, impulsionar a animação publicitária.
Produzir animação era na altura (e ainda hoje), bastante difícil em Portugal: requer imenso tempo, recursos humanos e material apropriado, o que eleva os orçamentos de produção.
Sem qualquer tipo de apoio estatal à produção independente, a publicidade surge como um meio de conseguir manter viva uma actividade de que tantos gostavam, uma vez que eram remunerados pelo seu trabalho.
Tornou-se então comum, no meio da animação, os realizadores produzirem pequenos filmes animados para produtos, sem que as empresas, que promoviam esses mesmos produtos, o tivessem proposto, um sistema a que se dá o nome de “ghost”. Muitos dos filmes realizados desta forma tinham a sorte de serem aceites pelo cliente. Foi deste modo que se fez animação durante muito tempo em Portugal.
Esses filmes publicitários concorriam também em festivais de animação, nas categorias de publicidade. Muitos realizadores de Animação Portuguesa foram premiados em festivais internacionais. Artur Correia ganhou o Prémio Annecy em 1967 com o filme “O Melhor da Rua”, um filme publicitário para a Schweppes (que apesar de ser vencedor, não foi aceite pela empresa promotora).
Será deste modo que a animação portuguesa sobreviverá até 1970, quando reaparece o filme de autor. “Eu quero a Lua", filme de Artur Correia, e único filme não comercial produzido pela Topefilme, vem abrir um novo caminho. “Eu Quero a Lua” é exibido em Bilbau em 1972 e é premiado com uma medalha de ouro.
Entretanto o panorama do cinema começa a mudar: Assiste-se em 71 à criação do Instituto Português do Cinema[2] que possibilita a realização de uma série de Contos Tradicionais Portugueses também da autoria de Artur correia e de Ricardo Neto. Todos os filmes desta série viriam a ser apoiados pelo IPC. Aliado ao apoio do IPC ao cinema de animação, a RTP faz várias encomendas a estúdios de animação para desenvolvimento de filmes educativos e aparecem depois as séries televisivas, como o “Romance da Raposa”.
Em 1974 Vasco Granja inicia um programa de cinema de animação de autor, que se manteve no ar durante dezasseis anos. No anos seguinte nasce a Associação Portuguesa de Cinema de Animação, também pela mão de Vasco Granja, e em 1977, realiza-se pela primeira vez o Cinanima, Festival Internacional de Cinema de Animação, e um dos marcos mais importantes na história do Cinema Português de Animação.
Contudo, este panorama, aparentemente positivo, não irá durar muito, e a partir dos anos 80 a produção de animação irá decair, mas desta vez, associado à crise nacional, está outro aspecto bastante relevante: a transformação e reestruturação de todo o sistema publicitário. Não nos podemos esquecer de que é na década de 80 que surgem as multinacionais, grandes empresas/grupos de publicidade, que acabam por esmagar produtoras mais pequenas, que, ou são compradas pelas multinacionais, ou se reorganizam em pequenos ateliers. Estas multinacionais acabam por comprar um maior número de espaço comercial nas televisões o que provoca uma procura menor por parte de outras empresas deste espaço, como consequência a produção de filmes publicitários animados diminui! A própria ideia de publicidade modifica-se. Os criativos passam a trabalhar com uma equipa formada: doutorados, psicólogos, assessores de marketing. Isso faz com que muitas vezes o filme de imagem real seja escolhido em detrimento da animação, remetida na maior das vezes para o filme publicitário dirigido ao público infantil[4].
Felizmente, os ateliers criados pelo Cinanima, e o impulso das novas gerações, influenciaram de modo positivo o Cinema de Animação, fazendo ressurgir o filme de autor.
Desde 1991 que o número de curtas-metragens de animação produzidas em Portugal tem vido a crescer significativamente. No ano de 2003 foram registados 14 filmes, e as médias de produção de 2004 a 2006 não se afastam muito deste número.
Mas seria possível fazer ainda mais e melhores filmes se não existisse uma deficiente dimensão do mercado aliada à situação desprotegida da produção portuguesa face aos filmes estrangeiros.
De qualquer modo o Cinema Português de Animação “vai no bom caminho”: os filmes produzidos apresentam uma elevada qualidade técnica e artística, sendo na maioria das vezes premiados em festivais internacionais. “A Suspeita” (1999) de José Miguel Ribeiro, que venceu 27 prémios [5], incluindo o Cartoon d’Or 2000, é um exemplo da qualidade da produção portuguesa. Mais recentemente temos o filme "História Trágica com final Feliz" (2005), de Regina Pessoa, que prima também pela sua qualidade, tendo ganho no passado mês de Junho o Grande Prémio de Annecy.[6]
Foram publicadas ainda as primeiras obras dedicadas ao Cinema de Animação Português. Em 2001 António Gaio publica "História do cinema Português de Animação – Contributos", é lançado também o livro Cinanima 25 anos, e “Cinema sem Actores – Novas Tecnologias da Animação Centenária”, de António Costa Valente. Em 2004, Ilda Castro publica "Animação Portuguesa -conversas com…".
Acontece ainda a criação de ateliers de animação no Festival de Avanca, assim como a criação de cursos que contemplam a animação como unidade curricular. Embora não exista em Portugal nenhum curso do ensino superior com a designação de Cinema de Animação, escolas como a ETIC (Escola Técnica de Imagem e Comunicação) ou a RESTART vão preenchendo o vazio que se faz sentir nesta área. Existem no entanto cursos do ensino superior que apostam já na escolha de uma unidade curricular dedicada à Animação para complementar a formação dos alunos, a UALG (Universidade do Algarve) foi a primeira universidade a integrar disciplinas de Imagem Animada nos seus cursos, actualmente, o curso de Design desta instituição possui duas disciplinas (Imagem Animada) no seu plano curricular; mais recentemente, na UBI (Universidade da Beira Interior) foi criado um mestrado em Estudos Fílmicos, que contempla também uma disciplina, intitulada Cinema de Animação. São pequenos passos que encaminham o Cinema de Animação e nomeadamente o Cinema de Animação Português, que necessita não só de criadores, mas de indivíduos qualificados que lhe dediquem o cuidado e estudo que merece.
[1] In Diário de Noticias ( 23 de Janeiro de 1923)
[2] Até o surgimento da televisão era costume passar no cinema, antes da sessão, um jornal de actualidades, um documentário de actualidades assim como pequenos filmes publicitários.
[3] O Instituto Português do Cinema é criado pelo Descreto Lei 7/71, contudo só em 1973 inicia a sua actividade
[4] É possivel que o filme de animação tivesse como objecto produtos dirigidos ao publico infantil. O Vitinho, associado à marca Milupa, é uma das criações mais evidentes das estratégias de marketing. Se verificarmos as encomendas de trabalhos de animação encontramos anunciados muitos produtos infantis, como chocolates, cromos, pastilhas, gelados etc.
[5] O Filme "A Suspeita" acumulou, entre 1999 e 2001, 27 prémios e 1 menção honrosa, nos 21 festivais onde concorreu. [Informação cedida por Paulo Cambraia]
[6] O filme "História Trágica com Final Feliz" de Regina Pessoa possui uma página: http://www.historiatragicacomfinalfeliz.com/ onde se pode encontrar, entre outras informações, a lista completa de prémios ganhos pelo filme.
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